PEÇA PROFISSIONAL
Suponha que a União tenha editado, em 31 de dezembro de 2007, uma lei complementar que novamente
instituiu a contribuição provisória sobre movimentação financeira (CPMF) destinando parte dos recursos
arrecadados à saúde e parte para as despesas comuns da União. Suponha, também, que o referido
diploma legal tenha previsto que as movimentações de pessoas físicas ou jurídicas que excedam, no mês,
o valor de R$ 1.000.000,00 fiquem isentas da contribuição. Suponha, ainda, que a empresa Pague Pouco
Ltda., que fatura mensalmente R$ 50.000,00, discorde da cobrança e procure um advogado para pleitear
judicialmente não apenas o direito de a empresa não pagar a contribuição, mas, também, de recuperar
todo o valor debitado a título de CPMF, em torno de R$ 1.200,00, desde janeiro de 2008 até hoje.
Diante dessa situação hipotética, na qualidade de advogado(a) da empresa, elabore a peça adequada aos fins almejados pela empresa,
de forma completa e fundamentada
Obs.: Não escreva nenhum nome ou número fictício. Para cada dado de qualificação, escreva o nome do dado seguido de reticências.
Por exemplo, escreva “Município ...”, data de hoje, “nome ...”, “estado civil ...”, além de todos os outros dados necessários à
qualificação.
Gabarito (comentários de BARREIRINHAS, Robinson Sakiyama. Como passar na OAB: Prática Tributára. 3 ed. Indaiatuba: Foco Jurídico, 2012, p. 201) A CPMF, hoje extinta, foi criada e sucessivamente prorrogada por emendas constitucionais, que alteravam o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Isso indica que há alguma vedação à sua veiculação por simples lei complementar, que é um dos pontos que deverão ser indicados pelo candidato. O primeiro passo é ler com atenção os dispositivos constitucionais que regulam a instituição de novas contribuições sociais. A competência para criar novas contribuições sociais (a CPMF descrita na questão seria uma delas) é prevista no art. 195, §4º, da CF: "Art. 195, §4º, da CF: A lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art. 154, I." O art.154, I, da CF, por sua vez, regula a competência residual da União, que deverá orientar a criação dessa nova contribuição social: "Art. 154. A União poderá instituir: I - mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição"(...)". Embora a nova CPMF descrita na questão tenha sido instituída por lei complementar, ela não preenche o segundo requisito do art. 154, I, da CF, pois é tributo cumulativo. De fato, tributo não-cumulativo é aquele que, na cadeia produtiva e comercial, permite o abatimento dos valores anteriormente recolhidos ao fisco, para diminuição do montante a ser posteriormente pago. É o caso do ICMS e do IPI, que permitem o creditamento, pelo adquirente, dos valores anteriormente recolhidos ao fisco. A CPMF não permite esse abatimento ou creditamento. Pelo contrário, é tributo cumulativo, que incide totalmente a cada nova operação. Essa é uma inconstitucionalidade. Ademais, as contribuições sociais submetem-se à anterioridade nonagesimal, nos termos do art. 195, §6º, da CF: "§ 6º As contribuições sociais de que trata este artigo só poderão ser exigidas após decorridos noventa dias da data da publicação da lei que as houver instituído ou modificado, não se lhes aplicando o disposto no art. 150, III, "b".No caso, a nova CPMF foi instituída em 31/12/2007 e passou a ser exigida imediatamente, no início de janeiro de 2008, descumprindo o preceito constitucional. Quanto à destinação dos recursos, as contribuições sociais caracterizam-se essencialmente pela finalidade, qual seja o financiamento da seguridade social, nos termos do art. 195, caput, da CF: "Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: (...)". A seguridade social engloba a previdência, a saúde e a assistência social. A destinação de parte dos recurso da nova CPMF para as despesas comuns da União prejudica, nesse sentido, a exação. Finalmente, o examinador chama a atenção para a isenção para pessoas que movimentem mais de R$1.000.000,00 por mês, enquanto a empresa Pague Pouco Ltda., que fatura mensalmente R$50.000,00, deverá recolher o tributo. Parece injusto, não? Essa é a dica. Trata-se de violação ao princípio da capacidade contributiva e da isonomia. Eis o que dispõe os arts. 145, §1º, e 150, II, da CF:"Art. 145, §1º - "Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.(...)Art. 150:Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:(...)II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;(...)" Não é razoável que uma empresa que movimente mais de R$ 1 milhão por mês não pague tributo, enquanto outra que, em princípio, apresenta menor capacidade contributiva, recolha CPMF sobre o valor total de sua movimentação financeira. Nesse sentido, é inconstitucional a cobrança de CPMF da empresa Pague Pouco Ltda. Não houve autuação, de modo que não há falar em anulação de lançamento. A intenção da empresa é não pagar o tributo e ter restituído aquilo que foi anteriormente recolhido. Não cabe mandado de segurança, que não substitui ação de cobrança (Súmula 269/STF). O correto, portanto, é formular pedido em ação declaratória de inexistência de obrigação tributára, com pedido incidental de declaração de inconstitucionalidade, além de repetição de indébito. É possível o pedido de antecipação de tutela, mas apenas para suspender os novos pagamentos. A restituição dos valores já pagos depende, em princípio, do trânsito em julgado da sentença condenatória. Não há mais execução provisória contra a fazenda pública, nos termos do art. 100, §5º, da CF (antes era Art. 100, §1º): "Art.100, §5º. É obrigatória a inclusão, no orçamento das entidades de direito público, de verba necessária ao pagamento de seus débitos, oriundos de sentenças transitadas em julgado, constantes de precatórios judiciários apresentados até 1º de julho, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte, quando terão seus valores atualizados monetariamente." Quanto à repetição do indébito, não se esqueça de consultar os arts. 165 a 169 do CTN para não se esquecer de nada. Importante lembrar que a natureza jurídica da CPMF não permite o repasse do ônus econômico para os clientes do contribuinte. Ou seja, é tributo direto, sendo inaplicável o requisito do art. 166 do CTN. Finalmente, para esgotar o assunto, interessante mencionar o prazo prescricional do art. 168 do CTN, a que muitas vezes é atribuída pontuação nos espelhos de correção. Mais uma vez, sugerimos a releitura do art. 282 do CPC, para que o candidato não se esqueça de nenhum elemento essencial da inicial. Remetemos o leitor às dicas que demos na introdução, principalmente no que se refere ao endereçamento e à confecção da peça.
Vejamos a estrutura argumentativa (silogismo):
1. Fato; o governo reinstituiu, por lei complementar publicada em dezembro de 2007, a CPMF, que é tributo cumulativo, e passou a exigi-la imediatamente, destinando parcela dos recursos arrecadados às despesas da União. Ademais, fixou isenção para as pessoas com alta movimentação financeira (acima de R$1 milhão mensais). Pague Pouco Ltda, que tem pequena movimentação financeira, vem pagando o tributo.
2. Direito: nos termos do art. 195, §7º, c/c art. 154, I, da CF, as novas contribuições sociais (não previstas no art. 195 da CF), deverão ser não-cumulativas. O legislador deve observar os princípios da anterioridade nonagesimal, da capacidade contributiva e da isonomia, ao instituir as contribuições sociais, cujos recursos destinam-se ao financiamento da seguridade social. As pessoas têm direito à declaração da inexistência de relação jurídica, nos termos do art. 4º, I, do CPC, e de restituição do tributo indevidamente pago, nos termos do art. 165 do CTN;
3. Conclusão: logo, a CPMF criada é inconstitucional, por ser cumulativa e violar os princípios da anterioridade nonagesimal, da capacidade contributiva e da isonomia, além de vincular recursos a despesas estranhas à seguridade social. Pague Pouco Ltda, tem direito à declaração de inexistência de obrigação tributária e à restituição do que pagou indevidamente.
Vejamos a estrutura argumentativa (silogismo):
1. Fato; o governo reinstituiu, por lei complementar publicada em dezembro de 2007, a CPMF, que é tributo cumulativo, e passou a exigi-la imediatamente, destinando parcela dos recursos arrecadados às despesas da União. Ademais, fixou isenção para as pessoas com alta movimentação financeira (acima de R$1 milhão mensais). Pague Pouco Ltda, que tem pequena movimentação financeira, vem pagando o tributo.
2. Direito: nos termos do art. 195, §7º, c/c art. 154, I, da CF, as novas contribuições sociais (não previstas no art. 195 da CF), deverão ser não-cumulativas. O legislador deve observar os princípios da anterioridade nonagesimal, da capacidade contributiva e da isonomia, ao instituir as contribuições sociais, cujos recursos destinam-se ao financiamento da seguridade social. As pessoas têm direito à declaração da inexistência de relação jurídica, nos termos do art. 4º, I, do CPC, e de restituição do tributo indevidamente pago, nos termos do art. 165 do CTN;
3. Conclusão: logo, a CPMF criada é inconstitucional, por ser cumulativa e violar os princípios da anterioridade nonagesimal, da capacidade contributiva e da isonomia, além de vincular recursos a despesas estranhas à seguridade social. Pague Pouco Ltda, tem direito à declaração de inexistência de obrigação tributária e à restituição do que pagou indevidamente.
QUESTÃO 1
Certa empresa agropecuária foi beneficiada com a isenção simples de
ITR sobre suas terras, em razão de uma lei publicada em 31 de dezembro de
2006 e que entrou em vigor em 1.º de janeiro de 2007. Em 19 de junho de
2008, foi publicada uma outra lei que cuidou exclusivamente de revogar aquela
que concedera a isenção e cuja cláusula de vigência previa entrada em vigor
após 30 dias da publicação.
Considerando a situação hipotética apresentada, explicite, justificando com base na legislação pertinente, quando, de fato, estará extinta
a citada isenção.
Gabarito (comentários de BARREIRINHAS, Robinson Sakiyama. Como passar na OAB: Prática Tributára. 3 ed. Indaiatuba: Foco Jurídico, 2012, p. 45): A revogação de isenção, relativa a imposto sobre o patrimônio, caso do ITR, sujeita-se ao princípio da anterioridade, nos termos do art. art. 150, III, b, da CF e do Art. 104, III, do CTN. Assim, a revogação da isenção ocorrida em junho de 2008, somente será eficaz a partir de 1º de janeiro de 2009, independentemente da disposição em contrário. É importante notar que a empresa agropecuária não tem direito adquirido à isenção. Somente o benefício concedida por prazo certo e sob determinada condição não pode ser revogado a qualquer tempo (art. 178 do CTN). Houve, no caso, isenção simples que pode, portanto, ser extinta a qualquer momento, observada a anterioridade.
QUESTÃO 2
Após três anos vendendo frutas exóticas e recolhendo, sobre as vendas,
o respectivo ICMS, determinado comerciante varejista verificou que a
comercialização daquelas frutas era isenta de ICMS. Deseja, então, receber o
que recolheu indevidamente durante os três anos.
Esse comerciante, na qualidade de contribuinte de direito, diante da situação hipotética descrita, tem o direito de receber de volta o
valor pago indevidamente? Justifique a sua resposta.
Gabarito (comentários de BARREIRINHAS, Robinson Sakiyama. Como passar na OAB: Prática Tributára. 3 ed. Indaiatuba: Foco Jurídico, 2012, p. 120-121) O ICMS é considerado tributo indireto, pois o ônus econômico correspondente é repassado, na forma da lei, aos adquirentes das mercadorias. Assim, presume-se que o ônus econômico foi suportado pelos adquirentes das frutas exóticas (contribuintes de fato), não pelo comerciante varejista (contribuinte de direito). Para que o comerciante (contribuinte de direito) pleiteie a restituição do ICMS indevidamente pago, deverá afastar a presunção de repasse do ônus econômico, ou seja, precisará comprovar que assumiu esse ônus. Opcionalmente, o comerciante poderá demonstrar que tem autorização de quem assumiu o ônus, para repetir o indébito. Essa é a disposição do art. 166 do CTN: "Art. 166. A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la.". É interessante lembrar que o prazo para a repetição é de cinco anos, contados da extinção do crédito, nos termos do art. 168, I, do CTN. Considera-se que a extinção ocorreu na data do pagamento indevido, nos termos do art. 3º da LC 118/2005. Como os recolhimentos foram feitos nos três anos anteriores, não houve prescrição.
QUESTÃO 3
Determinado contribuinte, em abril de 2006, apresentou declaração de
bens e efetuou o pagamento de seu respectivo imposto sobre a renda. No mês
subseqüente (maio/2006), o referido contribuinte verificou a realização de
recolhimento a maior.
Nessa situação, em que prazo e condições esse contribuinte poderá exercer o direito à
restituição do indébito tributário? Justifique a sua resposta.
Gabarito (comentários de BARREIRINHAS, Robinson Sakiyama. Como passar na OAB: Prática Tributára. 3 ed. Indaiatuba: Foco Jurídico, 2012, p. 120) Quem paga indevidamente tributo tem direito à restitução, independentemente de prévio protesto ou de comprovação de erro, nos termos do art. 165 do CTN. O IR é considerado tributo direto, ou seja, o ônus econômico correspondente é assumido pelo próprio contribuinte de direito (não é repassado a terceiros, como no caso do ICMS ou do IPI. Assim, não se aplicam as exigências do art. 166 do CTN. O prazo para a repetição é de cinco anos contados do pagamento indevido, nos termos do art. 168, I, do CTN. No caso, como o pagamento ocorreu em abril de 2006, o contribuinte tem até abril de 2011 para pleitear judicialmente a devolução do tributo indevidamente pago. Importante salientar que, caso haja pedido administrativo de restituição e ele seja denegado, o prazo para anulação dessa decisão prescreve em apenas dois anos, nos termos do art. 169 do CTN
QUESTÃO 4
Caso determinado contribuinte pratique uma doação com encargo visando dissimular a
ocorrência de uma transmissão onerosa de bens, tendo em vista que a alíquota incidente
sobre a 1.a
operação é inferior à da 2.a
, questiona-se se há previsão nas normas gerais de
direito tributário para que a administração pública venha, nos termos da lei, a desconstituir
a doação. Justifique a sua resposta.
Gabarito (comentários de BARREIRINHAS, Robinson Sakiyama. Como passar na OAB: Prática Tributára. 3 ed. Indaiatuba: Foco Jurídico, 2012, p. 50) Dissimulação significa ocultamento, acobertamento do que, de fato, ocorreu. No caso, o contribuinte transmitiu onerosamente o bem, dissimulando a operação sob a aparência de doação com encargo. O negócio jurídico dissimulado (alienação onerosa) subsiste, se válido na substância e na forma, conforme a legislação civil (art. 167 do CC). No âmbito tributário, a autoridade fiscal poderá desconsiderar o negócio jurídico praticado com o intuito de dissimular a ocorrência do fato gerador, conforme o art. 116, p. único, do CTN. Ou seja, não desconstituirá a doação (como consta na questão), mas irá desconsiderá-la e exigirá o tributo sobre a alienação onerosa.
QUESTÃO 5
O estatuto de determinada sociedade por ações prevê que a venda de
qualquer imóvel da empresa somente possa ser efetuada com a autorização do
conselho de administração. Determinado diretor, contrariando as regras do estatuto,
promoveu, por meio de escritura pública, a venda de um imóvel, sem a referida
autorização do conselho. Como o IPTU do imóvel estava atrasado, utilizou dos
recursos financeiros próprios para atualizá-lo, pois o comprador exigiu o prévio
pagamento daquele imposto para a realização do negócio. Requerido o reembolso
junto à empresa, foi o processo para análise da consultoria jurídica.
Nessa situação, em conformidade com o CTN, de quem seria a responsabilidade pelo pagamento do IPTU — do diretor, da empresa
ou do tabelião? Justifique a sua resposta.
Gabarito (comentários de BARREIRINHAS, Robinson Sakiyama. Como passar na OAB: Prática Tributára. 3 ed. Indaiatuba: Foco Jurídico, 2012, p. 60) A responsabilidade tributária do sócio refere-se exclusivamente às "obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes, infração de lei, contrato social ou estatutos" (art. 135, caput, do CTN). É incontroverso que o diretor violou os estatutos sociais, mas o IPTU em questão não resulta do ato por ele praticado. Perceba que, mesmo que não houvesse a alienação, a sociedade deveria recolher o tributo municipal. Poder-se-ia falar em responsabilidade do diretor, nos termos do art. 135 do CTN (ou mesmo do tabelião), em relação ao ITBI incidente sobre a venda, ou até em relação ao IR sobre eventual ganho de capital, mas não em relação ao IPTU devido por fato gerador anterior à transação. A sociedade por ações era a contribuinte de IPTU recolhido pelo diretor, inquestionavelmente, pois era a proprietária no momento do fato gerador. Não há falar, no caso, em responsabilidade tributária. Caberá à empresa avaliar se a operação de venda não lhe foi favorável e, eventualmente, buscar anular a transação e até ressarcimento por perdas e danos. Perceba que essa decisão não interfere no dever de recolher o IPTU relativo ao fato gerador anteriormente ocorrido, que é do contribuinte (sociedade).