domingo, 7 de junho de 2015

Questões de Segunda Fase - Tributário - Exame de Ordem Unificado - Cespe 2007.3

PEÇA PROFISSIONAL Em determinado município, foi publicada, em julho de 2006, uma lei que isentava de IPTU "os portadores de dificuldade de locomoção decorrente de deficiência nos membros inferiores" (in verbis). Após ser notificado, em janeiro de 2007, para pagar o IPTU de 2007, Aderaldo, portador de cegueira congênita, ajuizou ação contra o município, na qual pedia que fosse declarada a inexistência da relação jurídico-tributária referente ao IPTU, com a desconstituição daquele lançamento tributário. Na ação, Aderaldo alegou que, por analogia, enquadrava-se na mesma categoria dos "portadores de dificuldade de locomoção" citados na mencionada lei, uma vez que, segundo ele, os cegos também têm dificuldade de se locomover, muitas vezes, maior do que a dos deficientes motores. Aderaldo aproveitou a ação, também, para pedir o direito de não pagar a contribuição de iluminação pública, que é cobrada juntamente com as contas de energia elétrica. Apresentou como razões para tal pedido: a) que as notificações de pagamento que tem recebido não foram expedidas pela prefeitura, como exigiria o Código Tributário Nacional; b) que, no seu caso, não ocorreria o fato gerador da obrigação tributária, visto que, sendo ele cego e sendo o fato gerador de tal tributo uma situação de fato, aplicar-se-ia, no caso, a regra do caput e a do inciso I do art. 116 do CTN, que rezam: "Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos: I – tratando-se de situação de fato, desde o momento em que se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que normalmente lhe são próprios;". Conforme argumentação apresentada por Aderaldo, a definição do fato gerador da iluminação pública exige que o contribuinte se enquadre no conceito de receptador dessa iluminação, o que não ocorreria com ele. Na qualidade de advogado da prefeitura e considerando a situação hipotética acima, redija uma contestação à ação proposta por Aderaldo. Obs.: todos os dados não-disponíveis, sejam eles sobre Aderaldo, sobre o município ou qualquer outro que seja necessário especificar no texto, devem ser seguidos de reticências (como, por exemplo, “domiciliado ..., CNPJ ...”); no exame de sua peça serão consideradas a técnica profissional e a argumentação material sobre os três pontos levantados por Aderaldo.

Gabarito (comentários de BARREIRINHAS, Robinson Sakiyama. Como passar na OAB: Prática Tributára. 3 ed. Indaiatuba: Foco Jurídico, 2012, p. 209-210): Muita atenção: o examinador pede que seja formulada contestação à ação proposta pelo contribuinte. Ou seja, o candidato deverá defender o fisco municipal. Aderaldo, que é deficiente visual, pretende: a) não pagar IPTU, pois entende que é beneficiado pela isenção concedida aos "portadores de dificuldade de locomoção decorrente de deficiência nos membros inferiores"; b) não pagar a contribuição de iluminação pública, pois, (I) há vício na notificação e (II) não ocorre o fato gerador em relação a ele. Para solução do problema, é preciso, em primeiro lugar, ler atentamente os dispositivos constitucionais e legais atinentes. Quanto à isenção, Aderaldo faz interpretação extensiva, teleológica. Entretanto, o art. 111, II, do CTN é claro ao impor a interpretação literal desses benefícios fiscais: "Art. 111. Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre (...)II - outorga de isenção; (...)".No que se refere à contribuição para custeio de iluminação pública, vejamos o disposto no art. 149-A da CF: "Art. 149-A Os Municípios e o Distrito Federal poderão instituir contribuição, na forma das respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública, observado o disposto no art. 150, I e III. Parágrafo único. É facultada a cobrança da contribuição a que se refere o caput, na fatura de consumo de energia elétrica.". A leitura atenta do dispositivo constitucional dá a dica para a contestação. Note que o art. 149-A da CF não faz referência ao fato gerador da contribuição, mas sim à sua finalidade: custeio do serviço de iluminação pública. Isso porque as contribuições especiais não são definidas a partir do fato gerador, mas sim por sua finalidade. É impróprio, portanto, o argumento de Aderaldo, no sentido de que o fato gerador não ocorre com relação a ele. O que importa é que a finalidade da contribuição, que é o serviço de iluminação pública, está sendo atendida. Ademais, a iluminação das vias públicas é questão que interessa a todos, inclusive àqueles que não enxergam, já que é elemento essencial para a segurança. O parágrafo único do dispositivo constitucional rebate o argumento quanto ao vício na notificação. O próprio constituinte dispensou o município de lançar diretamente o tributo e notificar o contribuinte, já que a exação pode ser cobrada pela própria concessionária, na fatura de energia elétrica. Com relação à petição, a contestação é relativamente simples. Deve-se apontar, em preliminar, eventuais vícios na inicial (falta de procuração, de recolhimento de custas etc.) ou mesmo ausência de alguma das condições da ação (interesse de agir, legitimidade, possibilidade jurídica do pedido), conforme o art. 301 do CPC, que ensejam a extinção do feito sem julgamento de mérito, nos termos do art. 267 do mesmo Código. Não parece ser o caso, até porque não há maiores informações a respeito da inicial. Quanto ao mérito, basta rebater, ponto a ponto, os pedidos e a causa de pedir formulados pelo autor (art. 300 do CPC). É muito importante lembrar que, caso haja controvérsia quanto aos fatos, isso deve ser claramente apontado na contestação, inclusive com pedido de dilação probatória (art. 300 do CPC), sob pena de presumirem-se verdadeiras as alegações do autor (art. 302 do CPC)

QUESTÃO 1 João, caixa de um supermercado, registrou intencionalmente por R$ 100,00 uma compra feita por seu amigo José, sendo o preço de venda real da mercadoria igual a R$ 1.000,00. Sabendo que ocorreu, na situação hipotética descrita, a saída de mercadoria, fato que, por natureza, é gerador de obrigação tributária do pagamento do ICMS: (1) discorra sobre a natureza da responsabilidade pelo cumprimento da obrigação principal do tributo e (2) defina, com a indicação do dispositivo legal aplicável, de quem é a responsabilidade pelo pagamento do ICMS, que incide, respectivamente, sobre os R$ 100,00 registrados e os R$ 900,00 não registrados pelo caixa do supermercado.

Gabarito (comentários de BARREIRINHAS, Robinson Sakiyama. Como passar na OAB: Prática Tributára. 3 ed. Indaiatuba: Foco Jurídico, 2012, p. 61) Partindo da premissa de que José pagou, efetivamente, R$1 mil pela mercadoria, não há dúvida de que o ICMS incide sobre esse valor. Discute-se apenas a responsabilidade pelo recolhimento do imposto incidente sobre o montante não escriturado (R$900), sé é do contribuinte (supermercado) ou de eventual responsável tributário (João). Considerando que João (o caixa do supermercado) não furtou a diferença, vale dizer, recolheu os R$1 mil reais ao caixa da empresa, parece-nos que não há como afastar o dever de o supermecado (contribuinte) recolher o tributo devido sobre o total da operação, pois beneficiou-se da venda realizada, apesar da escrituração incorreta (o supermercado, na hipótese, apresenta capacidade contributiva). A rigor, não há informação de que o contribuinte (supermercado) se recusa a recolher corretamente o ICMS (muito embora a falta de registro adequado da venda poderá impossibilitá-lo, na prática). De qualquer forma, João pode também ser responsabilizado pelo recolhimento do tributo, nos termos do art. 153, II, do CTN, pois infringiu inquestionavelmente a lei. Há entendimento doutrinário no sentido de que a responsabilidade do empregado, na hipótese, exclui a do contribuinte (supermercado). Nesse sentido, João responderia exclusivamente pelo ICMS incidente sobre os R$900 não contabilizados. Não nos parece o melhor posicionamento, caso, repito, o valor total da venda tenha sido recolhido ao caixa da empresa (o supermercado efetivamente beneficiou-se da venda, apesar da escrituração errada). Note que não está em discussão eventual penalidade pecuniária pela infração (multa pela emissão a menor da nota fiscal) que pode incidir exclusivamente em desfavor de João, caso se configure a situação descrita no art. 137, III, b, do CTN. 

QUESTÃO 2 Rubem era sócio detentor de 90% das quotas de três sociedades limitadas, Grajaú, Mororó e Griffe, empresas sediadas no município de São Paulo – SP, com patrimônio líquido de R$ 400.000.000,00. Pouco antes de falecer, em Taubaté – SP, Rubem separou-se de sua segunda esposa, Marlene, e decidiu, ardilosamente, junto com seu filho Alberto, transferir a este, mediante uma falsa venda, todas as suas participações societárias, em detrimento de Marlene e dos filhos que com ela tivera. Com isso, as participações societárias em questão, que deveriam fazer legalmente parte do inventário de Rubem, deixaram de integrá-lo. Considerando, no que se refere à situação hipotética acima, que o capital social das empresas somava R$ 5.000,00, valor pelo qual fora feita a transferência, discorra sobre a ocorrência, ou não, no caso descrito, de crime de sonegação fiscal, identificando o(s) sujeito(s) ativo(s) contra o(s) qual(is) foi praticado o ato lesivo e o(s) tributo(s) relativamente ao(s) qual (is) houve a sonegação.

Gabarito, não oficial, comentado pelo autor do blog:  Primeiramente, resta claro o crime de sonegação, consoante dicção da lei nº 4.729/65: "Art 1º Constitui crime de sonegação fiscal: I - prestar declaração falsa ou omitir, total ou parcialmente, informação que deva ser produzida a agentes das pessoas jurídicas de direito público interno, com a intenção de eximir-se, total ou parcialmente, do pagamento de tributos, taxas e quaisquer adicionais devidos por lei; II - inserir elementos inexatos ou omitir, rendimentos ou operações de qualquer natureza em documentos ou livros exigidos pelas leis fiscais, com a intenção de exonerar-se do pagamento de tributos devidos à Fazenda Pública; III - alterar faturas e quaisquer documentos relativos a operações mercantis com o propósito de fraudar a Fazenda Pública; IV - fornecer ou emitir documentos graciosos ou alterar despesas, majorando-as, com o objetivo de obter dedução de tributos devidos à Fazenda Pública, sem prejuízo das sanções administrativas cabíveis; V - Exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte beneficiário da paga, qualquer percentagem sôbre a parcela dedutível ou deduzida do impôsto sôbre a renda como incentivo fiscal." Ademais, a Lei 8.137/90 assevera: Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias; II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal; III - falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável;IV - elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato; V - negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação. Pena - reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.Parágrafo único. A falta de atendimento da exigência da autoridade, no prazo de 10 (dez) dias, que poderá ser convertido em horas em razão da maior ou menor complexidade da matéria ou da dificuldade quanto ao atendimento da exigência, caracteriza a infração prevista no inciso V. No caso em tela, omitiu-se o recolhimento do ITCMD (Imposto sobre Transmissão "Causa Mortis" e Doação) . Esse tributo seria devido ao Estado de São Paulo (Trata-se de Tributo Estadual)


QUESTÃO 3 Ao chegar ao posto fiscal do estado de destino, João do Frigorífico teve toda a mercadoria perecível que transportava apreendida. A Fazenda Pública Estadual informoulhe que só haveria a liberação da mercadoria se o ICMS incidente fosse pago. João, então, procurou um escritório de advocacia para providenciar a liberação da referida mercadoria o mais rapidamente possível. Na condição de advogado contratado por João, comente a respeito do procedimento da Fazenda Pública do Estado, explicitando, com o devido fundamento legal, (1) se ela agiu de acordo com a lei e (2) se existe alguma providência judicial para socorrer o seu cliente.

Gabarito (comentários de BARREIRINHAS, Robinson Sakiyama. Como passar na OAB: Prática Tributára. 3 ed. Indaiatuba: Foco Jurídico, 2012, p. 40): A jurisprudência é pacífica no sentido de que o Fisco não pode apreender mercadorias lícitas, com o intuito de impelir o contribuinte a pagar tributos. É o teor da Súmula 323 do STF. Isso porque a medida é desproporcional, considerando que o fisco tem meio eficiente para o recebimento de seus créditos (execução fiscal). Ademais, haveria ofensa ao direito constitucional ao livre exercício da empresa. No caso descrito, há o agravante de que a mercadoria é perecível, de modo que a apreensão pode redundar em prejuízo irreparável para o empresário. João do Frigorífico pode impetrar mandado de segurança, pois há ato coator ilegal praticado pelo Fisco, desde que respeite o prazo de 120 dias contados a partir da apreensão da mercadoria e apresente, com a inicial, a comprovação do ocorrido (não há possibilidade de dilação probatória). É possível o pedido de liminar, para imediata liberação da mercadoria, pois há fumus boni iuris e periculum in mora


QUESTÃO 4 Apesar de a progressividade ser um instrumento de justiça fiscal e contemplar importante função extrafiscal, a Constituição Federal prevê expressamente sua aplicação apenas a três tributos. Identifique cada um desses tributos e discorra sobre o significado da(s) progressividade(s) aplicada(s) a cada um deles.

Gabarito (comentários de BARREIRINHAS, Robinson Sakiyama. Como passar na OAB: Prática Tributára. 3 ed. Indaiatuba: Foco Jurídico, 2012, p. 101-102): A Constituição Federal prevê expressamente a progressividade em razão da base de cálculo do IR, do IPTU e do ITR. Há também a progressividade no tempo, em relação ao IPTU. O IR deve, necessariamente, ter alíquotas progressivas, nos termos do art. 153, §2º, I, da CF, em atenção aos princípios da capacidade contributiva (art. 145,§1ª, da CF) e da isonomia (art. 150, II, da CF). Assim, quanto maior for o rendimento (pessoas físicas) ou o lucro (pessoas jurídicas) tributável no período, maior deverá ser a alíquota real aplicável. O ITR também deverá ter alíquotas progressivas, nos termos do art. 153, §4º, da CF, embora o objetivo primordial, nesse caso, seja desestimular a manutenção de propriedades improdutivas. O IPTU poderá (é uma possibilidade, não imposição, como nos casos do IR e do ITR) ter alíquotas progressivas em razão do valor do imóvel, nos termos do art. 156, §1º, I, , da CF, também em atenção aos princípios da capacidade conributiva (art. 145, §1º, da CF) e da isonomia (art. 150, II, da CF). É importante lembrar que o art. 182, §4º, II, da CF prevê também a possibilidade de o IPTU ter alíquotas progressivas no tempo (as alíquotas são majoradas ano a ano, nos termos da lei), de modo a estimular o adequado aproveitamento do solo urbano. 

QUESTÃO 5 Suponha que, no dia 31 de outubro de 2007, tenha sido publicada a seguinte lei federal: Art. 1.º Ficam isentos do pagamento: I – da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social sobre o Faturamento (COFINS): as operações de venda de veículos destinados a taxistas; II – do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA): a propriedade de automóveis detida por taxistas. Art. 2.º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação, no que se refere ao inciso I do artigo anterior, e, em 1.º de janeiro de 2008, relativamente ao inciso II.” Nessa hipótese, a partir de que momento essa lei passaria a produzir efeitos concretos, respectivamente, sobre a cobrança da COFINS e do IPVA? Justifique a sua resposta com base nos art.s 145 a 155 da Constituição Federal e legislação aplicável à espécie.

Gabarito (comentários de BARREIRINHAS, Robinson Sakiyama. Como passar na OAB: Prática Tributára. 3 ed. Indaiatuba: Foco Jurídico, 2012, p. 39); O IPVA é tributo estadual. Considerando que a competência tributária é privativa, a União não poderia instituir isenção em relação a esse imposto (art. 151, III, da CF - vedação das isenções heterônomas), o que somente poderia ser feito pelo respectivo Estado ou Distrito Federal. Assim, a isenção de IPVA veiculada por lei federal é inconstitucional e, portanto, jamais produzirá efeitos concretos. Com relação à COFINS, é possível a isenção veiculada, considerando que não há ofensa ao princípio da isonomia (o legislador pretende incentivar determinada atividade econômica, o que parece justificável). Ademais, a isenção, extinção ou redução de tributos não se sujeita ao princípio da anterioridade (aplicável apenas à instituição ou à majoração). Há uma pequena imprecisão no texto legal, pois a COFINS (e sua isenção, portanto) refere-se ao faturamento decorrente das operações de venda (não diretamente à própria venda), mas isso não prejudica o conteúdo da norma. Assim, a isenção a COFINS produz efeitos a partir da publicação, conforme o art. 2º da Lei, ou seja, a partir de 31 de outubro de 2007.

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